segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Rio Vivo 6 - JC2

DECRESCIMENTO
O sistema de valores e princípios sobre os quais assentou a organização da vida das sociedades humanas no último século, particularmente daquelas mais evoluídas tecnicamente, conduziu a um desequilíbrio planetário multifacetado, que já não é possível negar. O conceito de progresso humano baseado no produtivismo, na exploração desenfreada de recursos, no crescimento contínuo e na confiança cega no império das ciências e das técnicas, é cada vez mais posto em causa pela realidade física em que vivemos. Além de climatérica, energética, económica e ambiental, a crise que nos cerca é também filosófica, antropológica e política.
É assim que lentamente vai ganhando força a consciência de que urge definir o progresso humano de outro modo, criando modos de vida mais simples e com outro sentido. Quais eles sejam não é ainda claro. Talvez porque, como dizia o outro, no hay caminos, se hace camino al andar.
Em 1993, a revista SILENCE, de Lyon, publicou um dossier sobre o decrescimento, com excertos do livro do criador do conceito Nicholas Roegen.
Em 2004 apareceu o mensário La Décroissance, também em Lyon. E em 2008 surgiu a Entropia, revista teórica e política do decrescimento.
Entretanto formaram-se organizações como o MOC - Movimento dos Objectores do Crescimento. E em Outubro de 2008, Yves Cochet defendeu sem grande sucesso as teses do decrescimento, na tribuna da Assembleia Nacional Francesa.
É pensamento comum a todos estes campos que, por razões objectivas, deixará de haver crescimento tal como o temos entendido. Que só o decrescimento pode salvar o planeta. E que é esbarrando nos limites da biosfera que a humanidade será obrigada a tornar-se sensata.
O princípio dos 8 R's abarca genericamente o seu pensamento: Reavaliar, Reconceptualizar, Reestruturar, Redistribuir, Relocalizar, Reduzir, Reutilizar e Reciclar.
Mas não é nada fácil a concretização de alternativas. Os teorizadores destes movimentos criticam as ilusões do desenvolvimento sustentável. E sem defenderem a diminuição da produção, manifestam desconfiança em relação à democracia representativa, advogando a democracia directa e a acção associativa concreta.
A revista Silence privilegia o relato de experiências que prefiguram a sociedade a construir.
Na Inglaterra surge o conceito de cidades de transição, empenhadas no decrescimento energético, na relocalização, numa economia social e solidária e nas energias renováveis.
Trata-se de movimentos de carácter embrionário, algo utopista e marginal, dos quais se mantêm afastados todos os partidos tradicionais. A sua maior fragilidade está em que pouco conseguem dizer sobre o futuro a que aspiram. Sabem mais o que não querem, do que aquilo que desejam construir.
Na Europa, na América, no Canadá... vive-se o momento do debate de ideias, impasses e contradições.

4 comentários:

  1. DIAGNÓSTICO
    «Em cada minuto os paises do mundo gastam 1,8 milhões de dólares em armamento militar. Em cada hora morrem 1.500 crianças de fome ou de doenças causadas pela fome. Em cada dia extingue-se uma espécie animal ou planta. Em cada semana dos anos oitenta, exceptuando o tempo da segunda guerra mundial, foram detidos, torturados, assassinados, obrigados a exilar-se, ou oprimidos das mais variadas formas por regimes repressivos, mais homens do que em qualquer é poca da história. Em cada mês o sistema económico mundial acrescenta 75. 000 milhões de dólares à divida de bilião e meio de dólares que já está agravando de um modo intolerável os povos do terceiro mundo. Em cada ano destrói-se para sempre uma superfície de bosque tropical, equivalente às três quartas partes do território da Coreia.»
    Hans Kung, Proyecto de una Etica Mundial, Editorial Trotta, Madrid, 1992, p.17

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  2. A URGÊNCIA DO TEMPO...Metamorfose da Razão (I)

    O traço distintivo da nossa cultura ocidental foi denominado por Max Weber de racionalização. Desde René Descartes e o seu formidável projecto de poder, não cessámos de dominar o mundo sem qualquer moderação. Ao decretá-lo manipulável, calculável, dócil à medida, despimo-lo de todo o sentido. É um mundo «desencantado». A racionalidade mecânica esvaziou o potencial mágico que outrora habitava o viver e o fazer dos mortais, destruindo utopias, crenças e mitos. A vida, que surge espontânea e se sedimenta no mundo quotidiano, é suplantada pelo artificialismo formal e utilitarismo pragmatista. A natureza deixa de ser lugar de vivência e de convivência para converter-se em matéria de exploração. Com o nascimento da indústria moderna instalámos os meios de consumir a natureza até ao esgotamento total, segundo uma lógica puramente de mercado. A relação com a natureza tornou-se estritamente económica: compreende privilégios, mas nenhuma obrigação.O homem perdeu o sentido dos seus limites e desencadeou uma era de exploração destruidora da natureza, da vida e dos outros homens. Os princípios da simpatia e da solidariedade foram sacrificados ao princípio do poder.

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  3. Pensamento claro como água (da antiga).
    Diagnóstico exacto.
    Falta apenas acção, a possível, enfim.
    É para aí que este projecto vai.
    JC

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  4. E já agora, Gonçalves, porque não entrar neste comboio?!
    Dê notícias!

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